sábado, dezembro 24, 2005

As exportações da China (2)

As exportações da China são um tema quente desde a entrada na OMC em 2001 (Dezembro). Por isso congratulo-te pela escolha do tema. Mas esse gráfico pode ser visto de várias formas, e uma delas é deveras falaciosa. As exportações de tecnologia aumentaram exponencialmente na China e Índia nos últimos anos, mas o grande capital que é lá investido é de origem ocidental. Se os investimentos partem de cá, o grande lucro é também para cá transferido e podemos olhar para esse gráfico apenas como um aumento de produtividade (via baixos salários, baixos custos de transacção, baixos custos sociais de sindicatos) das empresas de tecnologia. A China não é um verdadeiro cluster tecnológico como por exemplo a Irlanda (será de interesse relacionar esse tigre celta com o dragão asiático, deve dar uma mistela engraçada).
Se quisermos pensar num prazo mais alargado a China pode constituir um poder emergente, mas para isso terá de investir na economia do conhecimento, e não fazer como hoje fazem em que os melhores alunos do liceu concorrem todos para universidades americanas (e raramente voltam). Um outro problema que os investidores estrangeiros deparam na China é que após feito o IDE, a China não tem know-how para deter chefes de secção ou órgãos de gestão capazes para poder, com sucesso, erguer uma boa fábrica exportadora. E outro problema, já mais cultural da relação patrão-empregado, em que o primeiro não se sabe afirmar. Claro que excepções não devem faltar, mas o interessante é olhar para a parcimónia do governo chinês quando de repente retrai a sua hostilidade ao exterior para uma liberalização que muitos países ocidentais não têm.
Outro aspecto que quero focar é a relação Europa-China. Se bem se lembram falou-se de uma Cláusula de salvaguarda, que visa proteger os têxteis e calçado principalmente. Porquê não accioná-la? Porque existe um lobby poderoso no parlamento europeu que é contra. Porque razões? O economista sensato diria que a liberalização global nunca é má porque só as empresas nacionais “mais fracas” é que sucumbiriam à concorrência chinesa (ex. empresas do norte de Portugal que ainda fazem as chamadas T-shirts e afins), assim as empresas teriam de realocar os recursos para sectores onde são mais eficientes (melhorando socialmente); outra razão que o economista apontaria seria que em Portugal e seguindo a tomada do gráfico do post anterior, as importações que fazemos de bens de tecnologia dependem mais da qualidade que do preço, eu p.e. dou mais importância à reputação da marca que ao diferencial qualidade/preço.
Mas a verdadeira razão para que a clausula de salvaguarda nunca irá ser accionada (de maneira eficaz na restrição) é porque todos os principais países do core europeu já tinham feito uma quantidade significativa de investimentos na China – Portugal e outros países (poucos) ditos menores na Europa não aproveitaram.
Digamos que a tecnologia 100% desenhada, inventada, produzida e distribuída pela china ainda vai ter de subir por essa curva toda de aprendizagem. Uma simples medida (que pode não ser assim tão fácil devido ao mandarim) poderia ser o ensinamento de inglês nas escolas para que houvesse mais facilidade na transmissão de informações na empresa. Outra ideia no seguimento é criar p.e comissões de gestores operacionais que aprendessem o mandarim e que exportassem esse conhecimento. Beneficiávamos nós (temporariamente) ao exportar e os chineses podiam melhorar as suas relações de eficiência dentro das empresas.

quarta-feira, dezembro 14, 2005

Pensões

Se há coisa que me dá prazer é falar de cor sobre assuntos económicos. Não que me custe muito esticar o braço e tirar os livros que ali tenho na estante, ou até fazer um menor esforço e como qualquer um de vocês, pesquisar com um clique no google sobre opiniões e factos que baseiem a minha opinião. Não. Eu não gosto de nada disso.

No ano passado numa cadeira que tive estudei o sistema de pensões que existem, e nesse estudo (que admito, foi pouco) fiquei com umas luzes sobre a coisa. Explicando brevemente, Portugal está no sistema pay as you go (PAYGo), ou seja, uma pessoa vai descontando ao longo da vida para a reforma, pagando com os descontos de agora as reformas actuais dos pensionistas. Outros países, v.g. Inglaterra, adoptam outro sistema que se chama Fully Funded (FF), e funciona como um depósito bancário (aliás existem várias opções privadas para esse efeito) que ganha uma taxa de juro supostamente acima da taxa de inflação média ao longo dos anos de desconto.

Ok, ainda me lembro que o facto de estarmos no sistema PAYGo não é mau na medida que só com este sistema se consegue chegar à afectação óptima (Golden Rule). Ou seja, a nível da segurança social todos sabemos que estamos numa crise tremenda e que tende a agravar-se alarmantemente nos próximos 20 anos. As alternativas são na minha opinião duas: alterar o sistema de pensões, passando para um FF que não depende tanto do Estado, o que reduzia bastante a pressão sobre este, acabando por reduzir o tão esperado “peso” do estado na economia nacional. A segunda alternativa passa por um choque na oferta agregada que se diz a via saudável da economia. As duas alternativas comportam custos:

1ª a geração que agora começa a descontar sairia muito prejudicada (vi um estudo qq que mostrava isso – Ah profissionalismo bloguistico…se fosse assim tão fácil nos exames), ou seja, pessoal desde a minha idade 22 até aos 35 +/- sairiam muito prejudicados porque teriam de financiar o envelhecimento da geração dos baby boomers e quando chegassem a velhos poderiam não receber. Mas com a inflação estável na zona euro é o melhor sistema para Portugal, até porque o nível de afectação óptimo na regra de ouro depende de um instrumento que não controlamos, a taxa de juro. De qualquer forma dado o clima de instabilidade o livro aconselhava algo interessante que ainda me recordo: “a melhor forma de não depender do sistema de pensões é enriquecer”. Obrigadíssimo.

2ª o choque da oferta agregada é bastante improvável, porque para isso seriam necessárias medidas estruturais que estão altamente atrasadas nas empresas portuguesas. A competitividade, o parente rico da produtividade, nas empresas portuguesas face às concorrentes europeias está apenas explorado na margem – não existem, na minha opinião razões para pensar que isso irá mudar nos próximos 20 anos (pois para mim partiria de uma politica de ensino superior politécnico bastante diferente. Vou reservar este tema para um próximo post).

Há quem defenda que existe outra alternativa (3ª), algo penosa, mas eficaz. De modo a alterar o desequilíbrio orçamental criado pelo crescente aumento dos encargos pensionistas, poderá afectar-se indefinidamente a idade da reforma (criando aquele ditado “a partir de agora é preciso + um papel para meter a reforma, a certidão de óbito.”), ou por outro lado pode-se criar um choque do lado das receitas. Em Portugal as receitas são impostos e esse instrumento está mais que saturado (olhar para a curva de Phillips). O único instrumento que vejo disponível curiosamente são um monte deles mas todos juntos: reduzir a despesa pública o que não é feito sem contestação social, o que implicará também crescimento do produto baixo. E sabemos pela lei de Okun que para crescimentos abaixo de 3%, o desemprego não baixará, até terá tendências ascendentes. Por outro lado juntamente com desemprego alto, deveremos apreciar a taxa de câmbio real, e como não podemos mexer na taxa de cambio nominal, temos forçosamente de ter uma taxa de inflação menor que a taxa de inflação média na Europa (e/ou parceiros comerciais).

Ora isto é extraordinariamente difícil, todas estas medidas estão envoltas de problemas e sem dúvida a 2ª alternativa seria o melhor que podia acontecer ao nosso pobre pais. Mas para isso teriam de haver mudanças importantes. Fica para uma próxima vez pensar um pouco nessas mudanças.

terça-feira, dezembro 06, 2005

OTA

É um assunto apelativo a não especialistas, tal como nós, mestres das opiniões infundadas. O tema que gostava de abordar é a localização, os argumentos que vejo a favor da Ota:

-1) Desenvolvimento de uma zona remota

-2) Acessibilidade

-3) Os terrenos alegadamente (palavra essencial neste argumento porque pode ou não corroborar a verdade, o que mostra que eu, tal como muitos jornalistas, não queremos saber da verdade, mas sim da noticia) pertencem a um candidato presidencial cuja idade supera a idade combinada de nós os três bloguistas. Pensando melhor, até daria para mais um.

Argumentos contra a localização na Ota:

-1) Longe demais de Lisboa

-2) Irá entupir ainda mais a entrada na capital pela 2ª circular

-3) Poderá não beneficiar a tempo do tgv

-4) Irá prejudicar o turismo em Lisboa dada a distância

-5) Terrenos com grande probabilidade de serem alagados e limitados no que diz respeito a expansão no futuro.

Agora os comentários. Como morador de Lisboa sei o que é viver com janelas fechadas no verão porque mesmo que estejam 40 graus na sala de aula, ninguém ouve o professor (mesmo com microfone) quando passa um avião. Mudar de aeroporto é algo que é imprescindível para a qualidade de vida.
Alguém que estivesse em Lisboa no euro 2004 sabe do que estou a falar, acordar ás 6 da matina com aviões a fazer um barulho descomunal não faz nada bem à saudinha.
Bem, a questão de entupir a 2ª circular é curiosa. Estamos a falar de algo que vai ser inaugurado em 2017, se o tráfego rodoviário for crescendo como até agora (mesmo nestes 4 anos que estou em Lisboa dá para notar uma diferença), a questiúncula da 2ª circular é irrelevante porque eu penso que será uma estrada em vias de expansão (criando substitutos viáveis q n se paguem, n como a CREL).
A questão 3) do tgv só mostra como vemos mal ao longe. O tgv parece que só está pronto em 2019, o próximo presidente terá entre os 80-94 anos, e como existe um lag anunciado entre a inauguração, tudo é um grande escândalo. Temos de olhar para onde estamos, somos um pais em que um mês para um empreiteiro tem uma interpretação muito abstracta. Todos nós sabemos que ou isto muda muito nos próximos dez anos ou em 2015 tá tudo à rasca porque ainda não está nada feito.
A questão do turismo é treta. Ninguém no seu perfeito juízo dirá “Epá já não vou passar férias a Lisboa porque o aeroporto é longe da cidade”. Aliás os turistas hoje em Lisboa dizem o seguinte “Este aeroporto (portela) é mesmo no centro da cidade”. Já agora, vão expandir a linha do metro até ao aeroporto da portela. Isto é uma decisão que faz pensar no poder da associação de taxistas de Lisboa na decisão da alocação das verbas para os transportes públicos.
Last, a teoria económica diz-nos através do modelo da cidade linear de Hotteling que a melhor localização será no centro de um segmento de recta onde se distribuem linearmente os consumidores alvo. As alternativas viáveis à Ota são uma na margem sul e outra em Alverca. As duas foram excluídas por falta de condições. Não há mais espaços, e curiosamente em Alverca o único que havia é em cima da reserva natural. Portugal pequeno… Se a Ota está no centro exacto dos utilizadores não sei, mas a Portela também nunca esteve.
Num país com dez milhões, o centro do aeroporto internacional para os lisboetas é no centro da cidade, onde toda a gente que queira um avião terá de entrar no trânsito. O egocentrismo lisboeta está latente em muitas opiniões publicadas, mas é compreensível, até porque tudo o que é para cima de Alverca “É Norte”. Aqui reproduzo um diálogo entre 2 lisboetas.
“já viste o novo aeroporto, é lá para cima. Ui, longe…”
“é verdade, quase em Coimbra ou assim!”
“com sorte ainda trocam os v’s pelos b’s lá, vai ser o abião”
“eu até tenho uns primos que moram por esses lados, como é que se chamam….”
“olha, devem ser os otários.”
Pronto ok, eu tentei a piadinha.

Deixo aos meus colegas a interessante questão do financiamento lembrando uma frase do nosso ministro da economia e inovação “Não se preocupem com o financiamento, afinal, a maior parte vai ser feito pelas gerações futuras.” Ele queria dizer quando o país tivesse saído da recessão, mas esqueceu-se, coitadinho.